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Cilene Pereira e Renata CabralUm novo e polêmico regime faz sucesso nos Estados Unidos prometendo a perda de peso por meio do consumo de pratos ricos em aroma e sabor
A mais nova promessa de emagrecimento rápido e sem sofrimento tem seu segredo não na boca, como é de costume, mas no nariz. No livro “Sensa Weight-Loss Program, the Accidental Discovery that´s Transforming the Way People Lose Weight” (em português, Programa de Perda de Peso Sensa, a Descoberta Acidental que Está Transformando a Maneira Pela Qual as Pessoas Perdem Peso), o neurologista americano Alan Hirsch sustenta que é possível emagrecer consumindo a refeição desejada, desde que ela seja bastante aromática.
Lançada no início do mês nos Estados Unidos, a obra logo alcançou destaque entre os mais vendidos da categoria saúde e bemestar, dando início a uma onda de pessoas caprichando nos temperos e outros artifícios culinários na esperança de perder alguns quilos. No livro, Hirsch conta que o grande estalo para o que considera uma revolução na maneira de tratar a obesidade veio a partir de sua experiência com portadores de doenças neurológicas e psiquiátricas. Em suas observações, o médico diz ter notado que um bom número de doentes apresentava prejuízo no olfato.
Ou haviam perdido esse sentido ou o tinham bem reduzido. Além disso – e aí teria sido sua principal constatação –, muitos engordavam. “Resolvi investigar o que acontecia”, disse ele à ISTOÉ. “Era o oposto do que imaginávamos.” De fato, o comum é pensar que, quando se perde a capacidade de sentir o aroma da comida, a tendência é comer menos. Portanto, emagrecer, e não engordar. Foi assim que, nos últimos 25 anos, ele coordenou vários estudos sobre a relação entre o olfato e o paladar e o ganho ou a perda de peso.
Os trabalhos foram desenvolvidos com sua equipe no Smell & Taste Treatment and Research Foundation, entidade fundada e dirigida por ele e com sede em Chicago, nos EUA. A última pesquisa, concluída há cerca de um ano, foi apresentada na reunião da Sociedade Americana de Endocrinologia. Hirsch pediu a 2.436 pessoas obesas ou com sobrepeso para colocarem em suas refeições uma variedade de compostos aromáticos – condensados em pequenos cristais – criados em seu laboratório. Os sabores dessas substâncias eram de queijo cheddar, cebola, molho ranch, taco, parmesão, cacau, hortelã, banana, morango, malte e amora.
Um grupo controle, com 100 pessoas, não usou os compostos. Todos os participantes foram acompanhados durante seis meses e receberam a orientação de manter inalterada sua rotina alimentar e de exercício físico. O índice de massa corporal (IMC), que atesta se uma pessoa está obesa ou não, foi medido antes e depois do estudo. Ao final, os 1.436 participantes que completaram o experimento perderam cerca de 15 quilos, comparado com apenas um quilo entre os integrantes do grupo controle. O IMC do primeiro grupo baixou cinco pontos, enquanto naqueles que não usaram as substâncias aromáticas a queda no índice foi de 0,3.
Saciedade precoce
A explicação de Hirsch para esses resultados estaria na ligação entre os aromas e o centro de saciedade do corpo, localizado no cérebro. “Ao atingirem o bulbo olfativo, as moléculas do cheiro acionam também o hipotálamo, estrutura responsável pela saciedade”, argumenta.
Portanto, segundo sua teoria, ao aspirarmos algo bastante aromático, acionamos mais rapidamente o sistema que diz ao organismo que não é mais necessário continuar ingerindo alimentos. “Se você passa muito tempo cozinhando um molho para o espaguete, quando vai comê-lo quase sempre já perdeu a vontade porque já sentiu demais o seu cheiro”, exemplifica o neurologista. O mesmo processo ocorreria quando, além de cheirosa, a refeição é saborosa. Isso aconteceria porque paladar e olfato estão intimamente associados.
A dieta proposta pelo neurologista, no entanto, baseia-se não no uso de recursos como temperos e ervas, que naturalmente deixam qualquer prato mais saboroso e cheiroso, mas na utilização dos cristais aromáticos que desenvolveu. Ao longo dos anos, ele diz ter testado quatro mil diferentes compostos. Chegou a 12 seis salgados e seis doces, que considerou mais eficientes. E são esses produtos que estão à venda, além do livro recém-lançado.
Adesivo para o olfato
As pesquisas de Hirsch acabaram gerando outras novidades. Hoje, há no mercado americano pelo menos três produtos que prometem a perda de peso a partir da potencialização do olfato. O primeiro é o Aroma Patch. Tratase de um adesivo que exala um cheiro de baunilha. Deve ser colocado na mão, no pulso ou no peito. O objetivo, segundo os criadores, é gerar uma espécie de resposta condicionada, como se o cheiro de baunilha estivesse presente o tempo todo para lembrar ao usuário que é preciso comer menos. “Quando você forma uma associação entre um cheiro específico e seu desejo de controlar a quantidade de comida que quer ingerir, aprende a controlar melhor o seu peso”, afirmou à ISTOÉ Steven Petrosino, responsável pela comercialização do adesivo.
ATRAÇÃO Segundo a nutricionista Kelly, o aroma dos alimentos influencia o apetite
O outro recurso é o SlimScents, uma caneta com aromas apontados como “agradáveis”. A pessoa deve inalar os cheiros minutos antes de iniciar as refeições. Há ainda o HappyScent. A fabricante criou objetos aromáticos, parecidos com pequenas velas, que contêm o cheiro de hortelã, banana e maçã verde. Eles devem ser colocados sobre a mesa de trabalho, dentro do carro, na bolsa. E devem ser cheirados cinco a seis minutos antes das refeições. Lançado no início do ano, o produto é um sucesso. “As vendas estão ótimas”, disse à ISTOÉ Donna Schilder, a responsável pela novidade.
No Brasil, a abordagem de usar o olfato para facilitar a dieta encontra sustentação entre vários especialistas. “O estímulo do aroma é capaz de produzir a liberação de hormônios que interferem no apetite”, diz a nutricionista Kelly Fu Chen, do Centro Emex, Nutrição Orientada, em São Paulo. “O resultado é uma saciedade precoce quando o estímulo da refeição começa antes de o garfo chegar à boca”, afirma a nutróloga Regina Mestre, do Rio de Janeiro.
“Dessa maneira, a sensação aparece antes do que a pessoa está acostumada”, completa Daniela Jobst, de São Paulo. Na opinião da nutricionista Patrícia Haiat, do Rio de Janeiro, há ainda outro efeito: “Ervas como manjericão e alecrim possuem óleos essenciais que induzem a reações como controle sobre o apetite e redução da compulsão”, diz. Na rotina de seus consultórios, as especialistas incentivam os pacientes a apostar em refeições ricas em cheiros e sabores. É o que faz, por exemplo, a psicóloga Liz Von Der Maase, 51 anos, de São Paulo.
ESCOLHA Faria alimenta-se com muitas verduras e legumes, mas sempre bem temperados
Usar os sentidos é um recurso do qual lança mão até na hora de escolher as frutas que vai levar para casa quando está fazendo compras. “Cheiro, toco no que desejo comprar”, conta. Em casa, Liz recorre ao manjericão, alecrim e gengibre, entre outras alternativas, para incrementar os pratos e aumentar o prazer na hora de comer. “Acredito que fazer uma refeição é muito mais do que apenas ingerir os alimentos. Quando não há opções que estimulem os sentidos, parece que está sempre faltando algo.” No Rio de Janeiro, Wesley Faria, 23 anos, era cliente tão assíduo do restaurante Universo Orgânico, onde os pratos são cheios de ervas e temperos, que acabou se tornando gerente do empreendimento.
“Os pratos me deixam saciados”, diz. A verdade, porém, é que ainda há muito a ser esclarecido nessa questão. É inegável que saborear uma refeição rica em aromas é muito mais prazeroso. Além disso, há de fato estudos além dos realizados por Hirsch – indicando uma associação entre olfato e apetite. Um trabalho feito pelo americano John Poothulil, por exemplo, apontou um resultado interessante. Durante um mês, ele orientou sete mulheres a prestar mais atenção ao paladar e olfato no momento de degustar um prato. Elas também deviam encerrar a refeição assim que o prazer não fosse mais tão significativo.
SATISFAÇÃO Para a nutróloga Regina, refeições saborosas podem ajudar a saciar a fome mais rapidamente
Depois do período da pesquisa e um ano após seu encerramento, todas tinham perdido peso. “Minha hipótese é a de que os seres humanos têm um mecanismo natural que usa o paladar e o olfato para regular a quantidade de comida ingerida”, disse o pesquisador à ISTOÉ. “As participantes ingeriram menos alimentos quando encerravam a refeição baseadas na satisfação sensorial.”
A armadilha do açúcar
Um outro experimento, realizado na Penn State College of Medicine, nos EUA, sugere que a obesidade gradualmente torna menos sensível o paladar para doces, levando o indivíduo a consumir mais desses alimentos. Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores implantaram eletrodos no cérebro de cobaias (ratos) magras e gordas para medir suas reações a vários sabores: salgado, cítrico, aguado e seis diferentes concentrações de açúcar.
Eles olharam para a parte do cérebro que processa as informações enviadas pela superfície da
língua. “Vimos que os ratos obesos tinham 50% menos neurônios trabalhando quando suas línguas eram expostas ao açúcar, o que sugere que eles são menos sensíveis a esse nutriente, afirmou Andras Hajnal, coordenador do estudo, publicado no “Journal of Neurophysiology”. A resposta aos sabores salgados foi a mesma em magros e gordos. “Concluímos que, se você sente menos o doce, tende a consumi-lo em maior quantidade para poder saboreá-lo mais”, disse o pesquisador. “Em vez de comer menos, aumentamos
nossa procura pelo paladar.
PRAZER A psicóloga Liz costuma sentir o aroma das frutas que vai consumir e também das refeições que irá saborear
E colocamos mais uma colher de açúcar no café.” O grande problema é que, por outro lado, também existem pesquisas demonstrando que quanto menos capacidade de sentir o cheiro e o sabor da refeição, menor é o ganho de peso. Isso porque a falta destes atrativos funcionaria como um fator de rejeição aos alimentos. Uma pesquisa divulgada na edição de abril do “Journal of Supportive Oncology”, por exemplo, provou que o câncer e seus tratamentos podem prejudicar o olfato e o paladar.
Isso, segundo os estudiosos, levaria os pacientes a adotar uma alimentação de qualidade ruim, podendo gerar inclusive uma subnutrição. Os cientistas da Virginia Tech Wake Forest University Comprehensive Cancer Center fizeram essa constatação após realizar uma ampla revisão sobre vários trabalhos acerca do tema. De acordo com Susan Duncan, professora de ciência da alimentação, um paladar ruim pode prejudicar a vontade de comer. No jornal “Neurology”, outra experiência, desta vez com mulheres portadoras de demência, apontou que cerca de 20 anos antes do aparecimento dos primeiros sinais do problema elas começavam a perder peso. Segundo os pesquisadores, isso seria resultado de uma perda de olfato associada ao início do desenvolvimento da doença.
Spray para emagrecer Com base nesses estudos – e trilhando caminho oposto ao sugerido pelo neurologista Hirsch –, a empresa Compellis Pharmaceuticals, nos EUA, está desenvolvendo um spray nasal para bloquear o olfato e, dessa maneira, diminuir a vontade de comer. De acordo com os fabricantes, estudos realizados previamente em animais indicaram que o produto seria eficaz. “Agora, estamos testando o spray em 25 pessoas”, contou à ISTOÉ Christopher Adams, diretor da empresa. Esta primeira fase dos estudos clínicos deve ser concluída até o final do ano. “Esperamos lançar o produto dentro de três anos”, disse Adams.
O fato é que, por conta de resultados tão díspares, para muitos estudiosos o assunto ainda é complexo demais para que se possa ter uma certeza cabal de qual seria, afinal, a relação entre o olfato e o paladar e o apetite. “Observamos que algumas pessoas que perdem esses sentidos de fato ganham peso. Mas outras emagrecem”, disse à ISTOÉ Richard Doty, diretor do Smell & Taste Center, da Universidade da Pensilvânia, nos EUA. Na opinião de Leslie Stein, pesquisadora do Monell Chemical Senses Center, também nos EUA, a diferença de respostas pode estar vinculada a fatores como a relação que cada um estabelece com a comida. “Algumas pessoas com o olfato e paladar prejudicados podem engordar porque comem mais, na tentativa de compensar a falta do prazer que esses sentidos proporcionam”, disse à ISTOÉ.
“E outras podem fazer o contrário, pela mesma razão.” Diante disso tudo, é possível ter pelo menos um consenso: a recomendação dos especialistas é a de que os sentidos devem sim ser usados na hora de comer. Mas sempre a nosso favor.
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