O sentimento de culpa, mais comum entre as mulheres e que ronda a maioria das nossas ações, pode ser domado
Camila de Lira, iG São Paulo |
Você não foi na ioga hoje? Comeu demais no jantar? Teve que ficar até mais tarde no trabalho e não teve tempo para os filhos? As situações são diferentes, mas o sentimento que ronda a cabeça da maioria das mulheres é o mesmo: a culpa.
De acordo com o médico e escritor Moacyr Scliar, autor do livro “Enigma da Culpa” (Editora Objetiva), em que analisa aspectos históricos, religiosos e psicanalíticos da culpa, o sentimento “resulta da consciência de uma transgressão ou de um conflito inconsciente”. Segundo Scliar, existe um fator que aumenta a pressão e dificulta a liberação da culpa: a sociedade e o peso que ela dá às coisas. “Os códigos de conduta são muito rígidos. Padrões demasiado exigentes, seja no trabalho, nas relações pessoais, isso gera muitas frustrações. A pessoa não atinge aquilo acha que os outros esperam dela e sente-se automaticamente culpada”, diz.
Para a colunista Regina Navarro Lins, psicóloga e autora de “A Cama na Varanda” (Ed. Rocco), somos frutos de uma cultura judaico-cristã em que o sofrimento é uma virtude. “A sociedade é toda baseada em culpa e pecado”, diz. De acordo com Navarro, existe uma construção da culpa desde a consolidação do catolicismo. Scliar concorda e completa: “O Jeová, do Antigo Testamento, é um Deus que vigia constantemente os humanos, e que não hesita em acusá-los e puni-los. Cristo procura absolver os pecados da humanidade, mas o cristianismo não acabou com a culpa, sobretudo em termos morais”, completa.
A culpa da mulher
No começo deste ano, pesquisadores da Universidade do País Basco, na Espanha, divulgaram um estudo sobre o sentimento de culpa. Eles questionaram 250 pessoas, de ambos os sexos, e chegaram à conclusão de que as mulheres sentem mais culpa do que os homens, principalmente as que estão na faixa dos 40 e 50 anos. Os altos índices de culpa feminina, segundo os pesquisadores, são causados por práticas educacionais que exigem mais das mulheres do que dos homens, repressão na infância e por danos causados em terceiros.
No campo dos desejos e relacionamentos, a psicóloga Regina Navarro cita a repressão sexual como a principal causadora da culpa. Ela explica que, durante muito tempo, vendeu-se que a marca da feminilidade era não ter prazer no sexo. “Esse discurso foi tão forte que ainda ecoa hoje quando as mulheres se sentem culpadas por transar no primeiro encontro, por exemplo”, explica.
A psicóloga Ceres Alves Araújo explica que a pessoa geralmente sente culpa quando percebe (ou acha) que fez algo errado, algo que pode desagradar alguém. Para ela, a culpa sentida na maternidade, por exemplo, é uma das mais comuns. Mas alerta que algumas mães exageram e sentem uma culpa descabida, como, por exemplo, a sentida quando é preciso voltar ao trabalho depois do término da licença maternidade. “Algumas mulheres se sentem mais culpadas ainda quando percebem que têm prazer em trabalhar”, diz. O sentimento vem de uma imagem pré-concebida de que a mãe precisa estar presente o tempo todo na vida do filho. “A criança consegue sobreviver longe da mãe, necessita de pessoas cuidando dela, claro, mas nem sempre precisa ser a mãe. Aliás, é bom para criança perceber que a mãe vai e volta”, diz.
Sete ações para atenuar a culpa, segundo Moacyr Scliar
1. Não negar a culpa
2. Aprender a diferenciar a culpa real da culpa neurótica, originária do inconsciente
3. Aceitar, sem se envergonhar ou se culpar, as fantasias sexuais e desejos proibidos
4. Aprender a conviver com a criança que temos dentro de nós, que controla muitos de nossos pensamentos e atos
5. Reconhecer que, muitas vezes, traz-se do passado uma raiva que se transforma em crônica e destrutiva ruminação
6. Não deixar que a culpa nos torne manipuláveis – pelo cônjuge, pelos filhos, pelos amigos, pelos colegas de trabalho, pelo chefe, por líderes políticos, por quem quer que seja. A manipulação através da culpa é um processo que, invariavelmente, conduzirá ao desastre psicológico
7. Tudo isto pode ser resumido em uma única palavra: compreensão. “O “homem é o único ser capaz de sentir culpa”, disse o filósofo Martin Buber, acrescentando: “mas é também o único ser capaz de iluminar a sua culpa.” A culpa iluminada, a culpa compreendida, é a culpa domada. Para compreender sua culpa, a pessoa pode necessitar da ajuda de familiares, de amigos, de colegas - e também de um terapeuta.
1. Não negar a culpa
2. Aprender a diferenciar a culpa real da culpa neurótica, originária do inconsciente
3. Aceitar, sem se envergonhar ou se culpar, as fantasias sexuais e desejos proibidos
4. Aprender a conviver com a criança que temos dentro de nós, que controla muitos de nossos pensamentos e atos
5. Reconhecer que, muitas vezes, traz-se do passado uma raiva que se transforma em crônica e destrutiva ruminação
6. Não deixar que a culpa nos torne manipuláveis – pelo cônjuge, pelos filhos, pelos amigos, pelos colegas de trabalho, pelo chefe, por líderes políticos, por quem quer que seja. A manipulação através da culpa é um processo que, invariavelmente, conduzirá ao desastre psicológico
7. Tudo isto pode ser resumido em uma única palavra: compreensão. “O “homem é o único ser capaz de sentir culpa”, disse o filósofo Martin Buber, acrescentando: “mas é também o único ser capaz de iluminar a sua culpa.” A culpa iluminada, a culpa compreendida, é a culpa domada. Para compreender sua culpa, a pessoa pode necessitar da ajuda de familiares, de amigos, de colegas - e também de um terapeuta.
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